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terça-feira, 28 de maio de 2013

LIVRO RECOMENDADO - 17/5 a 03/6 de 2013


Agrupamento de Escolas de Cabeceiras de Basto

Escola Básica de Arco de Baúlhe

 

Proposta de leitura para a quinzena de 17 de maio a 03 de junho

 

As Pupilas do Senhor Reitor, de Júlio Dinis:

Para quem ama boas histórias


Há muitos anos, fiz algo de que me orgulho muito e de que me não orgulho coisa nenhuma: roubei um livro. Eu sei que roubar é feio, que roubar é errado, que roubar é indigno. Nem a desculpa de, à época, eu ter apenas uns oito ou nove anos, é desculpa que se diga. Mas o livro chamava-se As Pupilas do Senhor Reitor, tinha uma capa bonita que sugeria histórias interessantes, ricas, coloridas, aquele quiosque da Rua da Sofia (em Coimbra) era pouco vigiado – e eu, enfim, Deus me perdoe, roubei aquele romance.

A proeza custou-me, nem dez minutos depois, um valente tabefe da minha mãe e a ameaça de que, em regressando à baixa coimbrinha, haveria de devolver o livro, sofrendo a vergonha provável das testemunhas que ali houvesse. Nunca o devolvi. Fiquei, digamos assim, em dívida.

O tempo, paciente, passou.

Li esse livro roubado com o prazer que só as experiências mais lindas e queridas podem provocar. Descobri que Júlio Dinis era (e é) um dos melhores contadores de histórias da nossa literatura. Não do século XIX, atenção. De sempre!

Fiquei tão apaixonado pela sua prosa que, à medida que tinha dinheiro e oportunidade, dei por mim a comprar tudo quanto o autor escrevera. E que pena foi ele ter morrido tão jovem (com cerca de 30 anos) – tanto que decerto ainda teria escrito, para eu ler, para nós lermos!

Sabei que o primeiro romance que Júlio Dinis escreveu não foi As Pupilas do Senhor Reitor. Foi um outro intitulado Uma Família Inglesa. Mas ele quis publicar, em primeiro lugar, As Pupilas. Teve, digo eu, a clara noção de que, no panorama literário português, era com esse romance que impressionaria o público leitor. Tratou-se, digamos assim, de um “cartão de visita” que fabricou e apresentou ao seu mundo, à sua época. Algo como isto: “Olá. Chamo-me Júlio Dinis. Escrevo assim… Gostam?”

No romance, a história fundamental passa-se no campo (talvez na região do Minho). Tudo começa com a vocação de Daniel para os estudos e para os amores. Depois, através da pena genial do escritor, temos numerosos episódios ora divertidos, ora dramáticos: namoros, discussões, anedotas, passeios, uma desfolhada, alguns conflitos, doces reencontros.

Página a página, há um Portugal colorido e vivíssimo que, ao ritmo apaixonado da leitura, nos entra olhos e alma adentro. Nunca talvez o mundo rural foi tão humanamente contado e mostrado como nos contos e, sobretudo, nos romances de Júlio Dinis.

Não por acaso, cerca de 35 anos depois do roubo que acima recordei, eu defendi uma tese de doutoramento, na área da Literatura Portuguesa – e chamei-lhe “Acção, Cenas e Personagens na Narrativa Dinisiana: As Pupilas do Senhor Escritor”. Foi a minha forma de pagar aquela dívida antiga.

Garantia: vale muito a pena ler este romance. Não é só para quem goste da maravilhosa magia de uma boa narrativa. É também, ainda, para quem (como eu) gosta da ideia – imaginária ou real – de um mundo simples e belo, em que as pessoas vivem simplesmente, formosamente, naturalmente. Como, lá bem no fundo, todos nós gostaríamos de viver.

 

 

Arco de Baúlhe, 17 de maio de 2013.

Joaquim Jorge Carvalho

segunda-feira, 15 de abril de 2013

LIVRO RECOMENDADO - 12/4 a 26/4 de 2013


Agrupamento de Escolas de Cabeceiras de Basto
Escola Básica de Arco de Baúlhe
Biblioteca
Quinzena de 12 de abril a 26 de abril

ELOGIO DO DICIONÁRIO

Eu gosto de dicionários.
Mais do que todos, gosto do Dicionário de Língua Portuguesa. Habituei-me, desde muito novo, a consultá-lo, a confiar no que ele me dissesse, a colher nele a sabedoria que normalmente só encontramos em pessoas muito velhinhas e muito inteligentes.
Bem sei, hoje há - na internet - o Google e outros motores de busca. Mas não é a mesma coisa. O meu Dicionário-livro tem um ritmo adequado às minhas dúvidas e à minha curiosidade. Não está dependente da eletricidade, do alcance de rede, da meteorologia, de tarifário & saldo, da eventual existência de pirataria informática ou erros de informação. Bato à porta da sua sabedoria, entro nele com olhos, dedos, cérebro – e beneficio sempre da sua luz como uma planta do sol.
Encanta-me a possibilidade de conhecer o sentido de algumas palavras em que, leitura a leitura, vou tropeçando no meu quotidiano leitor. E também me acontece, por acaso, enquanto ando à procura do significado de certos vocábulos, descobrir novos termos, que depois utilizo gulosamente, adequadamente, orgulhosamente.
Por exemplo, gostei muito de saber que havia uma palavra para dizer alma grande (bondosa, generosa, amável): longanimidade. Ou que obsoleto quer dizer ultrapassado, fora de moda, inútil (e que o nome certo relacionado com esse adjectivo é obsolescência).
Comoveu-me a ideia de que tristeza já foi (e ainda é, se quisermos) tristura. Que beleza também se pode dizer pulcritude. E que há outros preciosos substantivos (nomes) terminados em ude: atitude, beatitude, similitude, plenitude, completude.
Desconhecer palavras é um pouco como andar perdido no universo da linguagem. O Dicionário é uma luz, uma saída segura e certa. Também é, de certo modo, uma espécie de oxigénio da comunicação: conhecemos mais palavras, respiramos melhor. Vamos mais longe, mais alto, mais fundo, porque temos fôlego para tal.
É muito bela a minha, nossa Língua Portuguesa. Digo bela, mas poderia igualmente dizer linda, ou formosa, ou melodiosa, ou até amada. O Dicionário oferece-me mil adjetivos para exprimir o meu amor e a minha admiração. (Mil adjetivos é uma hipérbole. Hipérbole é um recurso estilístico que consiste numa forma de exagero retórico. Sei isto porque, há muito tempo, consultei o Dicionário e aprendi.)
O Dicionário é meu Amigo com maiúscula. Amigo ínclito. Ínclito significa ilustre e celebrado. Se não acreditas, vai ao Dicionário.

Cabeceiras de Basto, 12 de abril de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

LIVRO RECOMENDADO - 23/01 a 7/02 de 2013


 

 
 Descobri, há uns vinte anos, um escritor italiano chamado Gianni Rodari. Andava pelas prateleiras de uma livraria em Coimbra, à cata de autores e títulos que me despertassem a curiosidade e dei de caras com um título original: Histórias ao telefone (título original: Favole al Telefono). De pé, junto da estante, li um pequeno conto do volume com o nome “O caçador desafortunado”. A história era a de um caçador cuja espingarda se recusava, de certo modo, a funcionar. Melhor: era a história de uma espingarda que, em vez de matar, divertia e, portanto, em vez de fazer vítimas, antes lhes provocava alívio e as fazia rir.
O autor explicava que as histórias tinham sido fabricadas por um caixeiro-viajante (o senhor Bianchi, da cidade de Varese), o qual, em obediência a um pedido da filha, arranjava sempre uma fábula para cada noite. Como estava muitas vezes ausente em viagem, o homem recorria frequentemente ao telefone…
Comprei o livrinho, claro. E, já em casa, deliciei-me com outras pequenas e extraordinárias narrativas: “O palácio de sorvete”; “O passeio de um distraído”; “A casa de estragar”; “A mulherzinha que contava os espirros”; “O país sem ponta”; “O des-país”; “Os homens de manteiga”; “Alice Trambolhona”; “A estrada de chocolate”; “A inventar números”; “Brif, bruf, bruf”; “A compra da cidade de Estocolmo”; “Para tocar no nariz do rei”; “A famosa chuva de Piombolino”; “O carrocel de Cesanatico”; “Na praia de Óstia”; “O rato da banda desenhada”; “História do reino de Comilónia”; “Alice cai ao mar”; “A guerra dos sinos”; “Uma violeta no Pólo Norte”; “O jovem caranguejo”; “Os cabelos do gigante”; “O nariz desertor”; “A estrada para lado nenhum”; “O espantalho”; “A brincar com a bengala”; “Velhos provérbios”; “Apolónia das compotas”; “A velha tia Ada”; “O sol e a nuvem”; “O rei condenado à morte”; “O mágico dos cometas”.
Naturalmente, cada uma destas histórias não tem mais de duas-três páginas. O próprio autor o explica, naquela espécie de introdução em que se fala do senhor Bianchi: tratando-se de narrativas transmitidas “ao telefone”, nunca poderiam ser relatos muito extensos…
Ao longo dos anos seguintes, em muitas ocasiões, dei a conhecer estas histórias aos meus alunos. A minha mulher, que também é professora de Português, fê-lo igualmente. E não me lembro de um só leitor que, no final de cada leitura, não se tenha deixado seduzir pelo modo engraçado e inteligente de contar histórias que caracteriza a literatura de Gianni Rodari.
Este autor nasceu em Omegna (Itália), em 1920, vindo a falecer em Roma, em 1980. Foi, além de escritor, um jornalista de reconhecido mérito. A sua obra literária está traduzida em todas as línguas mais importantes.
No livro Histórias ao telefone, que recomendo aos leitores com fome de fantasia, há lugar para o humor e para a diversão – mas também para brilhantes notas poéticas que nos deixam a pensar, comovidos e encantados. Ofereço-vos, já agora, um formoso passo que encontrarão nas páginas 33-34, no final de uma história intitulada “A inventar números”: 
«- Quanto pesa uma lágrima?
- Depende: a lágrima de um menino mimado pesa menos que o vento, a de um menino esfomeado pesa mais que toda a Terra.» (Histórias ao Telefone, de Gianni Rodari, Lisboa, Editorial Teorema, 1987.)

 

Arco de Baúlhe, 25 de janeiro de 2013.

Joaquim Jorge Carvalho

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

LIVRO RECOMENDADO - 23/11 a 7/12 de 2012


A MONTANHA DA ÁGUA LILÁS, de Pepetela:
A história e as lições que uma história oferece


Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, mais conhecido como Pepetela, nasceu no dia 29 de outubro de 1941, em Angola.
Em 1960, entrou na Faculdade de Engenharia de Lisboa, mas acabou por optar por Letras e, mais tarde, enveredou por uma carreira política, vindo a ingressar no MPLA – Movimento Popular para a Libertação de Angola, em 1963.
Lutou pela independência de Angola e, por esse motivo, foi obrigado a fugir para França e para a Argélia. Após a libertação de Angola, o romancista foi para o seu país, em 1975, sendo então nomeado vice-ninistro da Educação, durante a presidência de Agostinho Neto.
Durante o exílio, licenciara-se em Sociologia na Universidade de Argel, tornando-se mais tarde, já em Angola, professor na Faculdade de Arquitetura de Luanda.
Em 1997, Pepetela venceu o Prémio Camões, um dos mais importantes da língua portuguesa. Esta distinção ajuda a consagrálo como um nome muito importante da nossa literatura.
A Montanha da Água Lilás é uma espécie de fábula em que o escritor, para, além de contar uma história divertida, passada na selva, consegue fazer pensar os leitores em assuntos fundamentais da vida em geral (dos animais e – sobretudo – dos humanos).
A comunidade de macacos representa a própria organização das sociedades humanas. Há naquela sociedade da montanha diferentes modos de ser, de agir, de pensar. Há os que mandam e os que obedecem. Há os que gostam de trabalhar e os que são preguiçosos. Há os que são amáveis e generosos, há os que são arrogantes e agressivos. Quando se dá a descoberta de uma riqueza (a água lilás, que tem propriedades maravilhosas), deveríamos esperar, em princípio, uma melhoria significativa da vida da comunidade. Contudo, a novidade acaba por provocar transformações que, pouco tempo depois, significarão uma verdadeira degradação da vida do povo “lupi” e de todos animais em geral.
O livro acaba por ser, pois, uma lição sobre os perigos da ambição desmedida, do egoísmo, da inveja, da arrogância, da intolerância e da vaidade.
Os únicos seres que parecem resistir ao mal são um Pensador e um Poeta. O Pensador representa, claramente, a Filosofia (a capacidade de refletir sobre a vida e sobre o comportamento das sociedades e dos indivíduos). É a voz da Razão: vê, desde logo, o perigo que há em ceder à preguiça, ao egoísmo, à inveja, ao culto do lucro fácil, à arrogância.
Por sua vez, o Poeta (representante da Poesia, da Arte e do Sonho) tem, para além da sua natural inteligência, uma sensibilidade particularmente apurada que lhe permite saber, com antecipação, o que irá acontecer no futuro se os seus semelhantes teimarem em perseguir apenas a riqueza material, sem terem em atenção o bem-estar físico e psicológico dos seus semelhantes.
No fundo, o Pensador e o Poeta são, ali, os últimos resistentes. São, no fundo, os que sobrevivem sem perder o sentido ético (o sentido do Bem, da Verdade e da Justiça) e o sentido da Liberdade (pensar pela própria cabeça, sem medo de castigos e sem medo do esforço que uma vida livre e digna exige).
Não ler este livro é perder uma excelente história. E é também desperdiçar a oportunidade de dialogar com um grande escritor da língua portuguesa.

Arco de Baúlhe, 23 de novembro de 2012.
Joaquim Jorge Carvalho

quinta-feira, 15 de novembro de 2012